Entre as imagens fúnebres dos ataques aos traficantes nas favelas do Rio de Janeiro, disfarça e chora e tente imaginar na alvorada lá no morro a imagem maravilhosa de Angenor de Oliveira, o Cartola, a sorrir, pretendendo levar a vida. O homem que fundou a Mangueira, uma das escolas de samba mais tradicionais do país, faleceu há 30 anos, no dia 30 de novembro de 1980, deixando todo brasileiro cantando que nada consegue fazer quando a saudade aperta.

Saudade de um Brasil mais solidário personificado na figura de Cartola, o sambista que adorava unir músicos e poesia em sua casa. E depois, ao fundar com sua mulher, a também mítica, Dona Zica, o restaurante ZiCartola, fez do local a casa de sambistas como Elton Medeiros e Paulinho da Viola. Novamente o bom coração e a generosidade falou mais alto e Cartola deixava muitos de seus amigos fregueses comerem fiado, a falência foi inevitável. Acontece.

Pobre desde sempre assim como genial, o sambista sempre era resgatado por algum admirador, quando sumia por tempos nas rodas de samba. Foi assim que Sergio Porto o encontrou lavando carros em Ipanema na década de 50, quando era dado como morto. O nosso Stanislaw Ponte Preta (apelido de Sergio) ao tê-lo visto deve ter gritado: “alegria, era o que faltava em mim”. Ou depois do fechamento do ZiCartola, ao trabalhar como funcionário público servindo cafezinho em repartição, foi reconhecido por um filho de um alto escalão que fez com que tivesse uma função que pudesse também ensaiar seus sambas. Ordenes e farei.

As rosas não falam, mas nós – brasileiros e cariocas – temos o dever de dizer bem alto que da favela hoje mergulhada ao ritmo dos fuzis, também tem a cadência da poesia. Que a imagem de Cartola nos guie!


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30 anos sem Cartola