Colocar uma mochila nas costas e sair para ver o mundo com os próprios olhos sem prazo de acabar é a vontade de muita gente. O desejo tem sido tão recorrente que, com a ajuda da tecnologia, hoje é possível ser um nômade digital. São pessoas que mantêm seus trabalhos à distância para terem mais liberdade, conseguirem passar um tempo na estrada e colecionarem endereços diferentes.

Pois é justamente isto que tem feito a família da Thais Saito e do Angelo Damião. O casal de brasileiros não tem uma casa fixa há quatro meses e viaja na companhia dos quatro filhos: Melissa, 12 anos, João, 11, José, 9, e Coral, 4. Neste período, Angelo continua trabalhando remotamente como consultor de SAP enquanto se diverte com as crianças e garante as contas em dia. Enquanto Thais se dedica a contar todas as aventuras e desventuras desta turma no blog World Trip Diaries.

Familia

A vontade de morar um tempo fora do País fazia parte das conversas de Thais e Angelo quando ainda namoravam. Mas, tinha faculdade, trabalho, então vieram o casamento e os filhos e a ideia foi ficando mais distante. Há oito anos, eles decidiram colocar parte do sonho em prática e a família – que ainda não estava completa – partiu para um ano no Japão para que as crianças pudessem conhecer melhor ao avós maternos, que moravam lá na época. 

“A ideia era apresentar as crianças aos meus pais e retornar. Acabamos ficando por dois anos e, ao invés de voltar ao Brasil, viemos para a Nova Zelândia”, escreve Thais no blog. Eles viveram em Auckland, capital do país, por seis anos e foi lá que nasceu a caçula do casal, a fofa Coral.

Mas, há quatro meses, a família decidiu dar mais um passo e colocou exatas seis mochilas, duas malas e três caixas de brinquedos e livros no carro e, desde então, tem vivido na estrada e conhecido melhor cada cantinho da Nova Zelândia.

Eles passam em média uma semana em cada cidade e, enquanto desbravam o que os destinos têm a oferecer, se revezam nos estudos. As crianças aprendem no sistema “worldschooling”, nome dado para a educação enquanto se viaja.

O Virgula conversou com a família sobre as dificuldades de tomar esta decisão e sobre a rotina de viver sempre se deslocando com quatro crianças e toda a casa dentro de um carro. Com a palavra, a mãe Thais:

A decisão:
A gente sempre quis fazer essa viagem. O único problema é que nunca era a hora: ou as crianças eram pequenas, ou o emprego não deixava, ou era perigoso, ou tinha escola, ou qualquer coisa. Pensamos por muito tempo sobre isso, em fazer depois que as crianças saíssem de casa, ou quando fossem grandes o suficiente para se virarem melhor. Mas resolvemos cair na estrada agora porque, se a gente esperasse mais um pouco, os dois filhos mais velhos não iam mais querer ir junto.

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Antes de decidir, dinheiro, saúde, segurança foram nossas principais preocupações. Os incentivos eram muitos, mas o maior seria mostrar o mundo para as crianças. Quanto mais diversidade eles vivenciarem agora, melhor!

Na estrada, percebemos que nossos gastos são basicamente os mesmos de quando tínhamos casa e vivíamos parados, viajando apenas nas férias. Por enquanto, não vimos diferença nisso.

As malas:
Saímos de casa com seis mochilas lotadas, duas malas em cima do carro, três caixas de jogos, brinquedos e livros e várias sacolas espalhadas pelo carro inteiro. Hoje, temos seis mochilas, uma bolsa de remédios, uma bolsa de banheiro (com xampu, sabonete e outras coisas) e duas sacolas de cozinha. Só. A cada parada, deixamos um pouco das nossas coisas para trás! Aprender a viver com menos é uma arte e uma luta constante. Como carregamos poucas coisas, nos divertirmos com o que temos ali na hora, mas eu acho bom porque as crianças precisam imaginar mais.

A rotina:
Estamos viajando sem ter endereço fixo há quatro meses. Temos uma ideia geral para escolher os destinos e levamos o tempo em conta. Por exemplo, escolhemos a Ilha Sul da NZ, então abrimos espaço para que todos possam escolher o que querem ver e fazer. Temos ficado entre uma e duas semanas em cada lugar, depende das atividades e do valor: em lugares caros, ficamos menos. Se tem muita coisa que a gente quer ver e é barato, ficamos mais. Menos do que isso, evitamos por ficar muito cansativo, a não ser que seja bem perto.

A alimentação é basicamente a mesma que tínhamos antes. Como alugamos casas, sempre tem cozinha, por menor que seja. Às vezes precisamos ser criativos porque tem casa sem forno, tem casa com fogão de acampamento, tem casa sem panela grande, tem casa onde as facas não cortam nem ovo cozido!

Os estudos em casa:
As crianças estudam em casa há alguns anos já. E é bem tranquilo porque cada um escolhe sobre o que quer aprender e aprende. Se vamos fazer alguma coisa todos juntos, cada um faz o que está de acordo com o seu desenvolvimento. Por exemplo, a gente leu um livro juntos. A Coral, se ela ouvir e pegar algumas partes da história, já está bom. Da Mel, eu espero bem mais: quero um entendimento bem fundo da história e quero que ela pesquise sobre o contexto histórico (se existir um), por exemplo.

Família de brasileiros está há quatro meses vivendo sem endereço fixo e percorrendo os quatro cantos da Nova Zelândia!

O estilo de vida nômade:
As crianças reclamam de ficar horas dentro do carro por ser chato demais e também de arrumar as malas toda semana por ser cansativo. Mas todos eles disseram que está valendo a pena. O sonho deles é inventar uma máquina de teletransporte para pular essas horas chatas e infinitas (apesar de não terem reclamado na última viagem, graças ao Pokémon Go!). Eles gostam de conhecer lugares novos e ver coisas que eles nem imaginavam que existiam. Eles gostaram de passar um tempo morando de frente para um lago, de comer comidas diferentes. De viajar, mesmo.

Uma coisa difícil é fazer as vontades de todo mundo. Mas conversamos e entramos em um acordo. Aprender a abrir mão e fazer escolhas faz parte do nosso dia a dia desde sempre.

Os melhores e piores momentos até agora:
O pior momento foi a hora de vender a casa em Auckland e tudo o que a gente tinha. Vivemos cinco anos lá, a Coral nasceu naquela casa, tudo trazia uma lembrança de algum momento. E foi bem cansativo.  Os melhores momentos tem sido muitos, difícil enumerar algum em especial. Mas vi a nossa família ficar muito mais unida nestes últimos meses e eu acho que só isso já valeu tudo.

A experiência:
Impossível, não é. Não é fácil, mas não é tão complicado quanto parece. Acho que o mais difícil é viver longe da rede de apoio, sem família, sem amigos e ter que começar do zero. Mas acostuma-se. E criamos novos laços. O único conselho que eu poderia dar seria ‘se você quer, vai’. Se não tentar, nunca vai saber se é ou não possível. E sempre dá pra voltar, se tudo der errado.

Os cuidados são os mesmos do que em qualquer lugar, não tem nada que seja especial para quem viaja muito. Talvez, manter um telefone, e-mail, ou alguma forma de contato sempre com cada criança, para que caso se percam ou precisem, consigam pedir ajuda mesmo sem saber falar a língua. E sempre deixar pessoas avisadas da onde estamos.

Os benefícios de se viajar com filhos são muitos, mas dividir aprendizados e vivências é muito gostoso. É possível fazer mesmo sem viajar, mas viajando é mais fácil!

Confira na galeria um pouco do dia a dia da família compartilhada nas redes sociais:

Pai, mãe e quatro filhos caem na estrada

Família de brasileiros está há quatro meses vivendo sem endereço fixo e percorrendo a Nova Zelândia!
Família de brasileiros está há quatro meses vivendo sem endereço fixo e percorrendo a Nova Zelândia!
Créditos: Reprodução / Instagram / @wtripdiaries

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Casal de brasileiros desfaz casa e cai na estrada com os quatro filhos