A organização popular para alcançar um objetivo de bem comum sempre existiu, desde a Antiguidade, mas os avanços tecnológicos mudaram – e muito – a forma como as ideias são difundidas entre grupos de mesmo interesse. Não é preciso pensar em um passado muito distante, para encontrar diferenças radicais das ações do povo ao longo dos anos. Em 1992, uma onda de manifestações tomou as ruas pelo impeachment do ex-presidente Fernando Collor, mas a organização do movimento foi um tanto mais trabalhosa, restrita e lenta do que a praticada para as manifestações que acontecem no Brasil desde 2013, segundo avaliou o professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas, Michael Mohallem.

Ele, que esteve presente em um dos protestos mais importantes dos caras-pintadas em 1992, jamais compareceria ao evento se não fosse a professora da escola onde estudava liberar os alunos e apoiar a manifestação nacional. “Naquela época, se contava com instituições, as redes eram formadas por pessoas. Talvez aquela professora tivesse contato com organizadores”, contou.  As redes sociais facilitam esse processo, possibilitam alcance em larga escala: só para a manifestação do próximo domingo (13) em São Paulo, são esperadas um milhão de pessoas, segundo a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo.

A organização da manifestação, VemPraRua, tem mais de 900 mil seguidores no Facebook, o que significa que qualquer compartilhamento de informação pode atingir um grande número de pessoas em segundos. “Antes das redes sociais, era preciso o trabalho forte de centenas de pessoas para organizar ideias e disseminá-las, isso levava tempo. Para bater a mesma escala atingida hoje com o uso das redes sociais daria muito trabalho”, comparou Mohallem. É o que o sociólogo Rafael Araújo intitula de “mobilização horizontal”, em que qualquer usuário da internet pode iniciar um debate político via web.

“Hoje pessoas veem no Facebook que amigos vão à manifestação e se sentem incentivadas a ir também”, disse Mohallem, a coordenação de uniões estudantis e grêmios perdeu força, segundo ele. O mesmo vale para a imprensa. Araújo explicou que no passado existia uma centralização da rede de comunicação, que selecionava quais informações chegariam à população. As redes sociais acabaram com esse poder e atualmente não só questionam a forma como o conteúdo é transmitido ao povo, como também pautam o noticiário. “Uma pessoa pode ter mais audiência que o Jornal Nacional, pode desbancar uma informação”, acrescentou.

Além da velocidade e escala que se ampliaram com a incorporação das redes sociais como ferramenta de debates políticos, também houve a pluralização de pautas, segundo avaliou o cientista político Pedro Fassoni. “As minorias, hoje, conseguem criar movimentos, as vozes se ampliam. Antes, as pessoas eram passivas, recebiam informações de três ou quatro telejornais. Hoje elas produzem informação, até usando um celular”, comparou Fassoni. Segundo o especialista, as redes sociais possibilitaram o questionamento de versões apresentadas pelos noticiários.

É claro que toda agilidade e liberdade para qualquer indivíduo produzir e compartilhar informações caminha junto à divulgação de dados falsos, discussões superficiais e falta de controle sobre atos políticos. Confira na galeria acima as principais mudanças dos protestos antes e depois das redes sociais e como elas impactam no debate políticio.


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'Caras-pintadas do Facebook': as mudanças nos protestos desde os anos 1990

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