Uma faixa que não parece formatada para tocar em rádios dance e pistas de danças, como a de um artista de MPB, por exemplo, pode ficar perfeita após a adição de efeitos por meio de softwares específicos. É o famoso remix, que já colocou nas paradas muitos músicos que, ao menos teoricamente, não fazem canções para serem tocadas em baladas.

No Brasil, alguns dos artistas que já foram vítimas, no bom sentido, desse fenômeno são Vanessa da Mata, Seu Jorge e Jorge Vercillo, respectivamente: as versões de Ai Ai Ai, Burguesinha e Que Nem Maré tocam até hoje em casas noturnas voltadas a um público mais pop. E, curiosamente, os responsáveis pelas transformações das músicas desses e de outros artistas conhecidos são nomes totalmente desconhecidos do grande público. Conheça alguns deles abaixo:

Crossover

O Crossover, projeto criado pelo produtor e DJ Júlio Torres e o instrumentista e arranjador Amon Lima, integrante da Família Lima, tem como objetivo incorporar sonoridades típicas da música clássica com ritmos da eletrônica. Com um disco autoral no currículo – Humanized, no qual trabalham com sonoridades da house music -, a dupla está ganhando nome ao produzir remixes para diversos nomes do atual cenário pop.

Um dos artistas que solicitaram seus serviços é o grupo Jota Quest, de quem remixaram a faixa Seis e Trinta, do último disco dos rapazes, La Plata. Eles também trabalharam com Sandy na música Scandal, que surpreendentemente fez muito sucesso no Canadá ao ser lançada, em maio, chegando a atingir a marca de 13º música mais tocada no país.

“Remixar é sempre um pesadelo divertido. O mais desafio está em esquecer como era a música original e visualizá-lo como uma faixa nova”, diz o violinista da Família Lima. “Deixo a parte inicial com o Julio, para evitar que eu entre de cabeça com arranjos, que não são tão importantes num remix. Após termos um groove pronto, toco instrumentos em cima e testo elementos da versão original para ver o que funciona”.

Para Julio Torres, compor e remixar é, na verdade, um trabalho bastante parecido. “A única diferença é que precisamos ter a cabeça formatada para fazer algo mais pop. Com esse direcionamento, a coisa acontece naturalmente”, afirma ele.

“Um bom profissional sabe extrair do artista o que ele tem de melhor e, ao mesmo tempo, torná-lo comercialmente viável. Mas, hoje em dia, o produtor é vedete: a gente ouve a música de caras como Tiesto e Fat Boy e não faz a mínima ideia de quem canta”, finaliza Lima.

Produção independente

Insatisfeito com o cenário da música eletrônica no Brasil, o produtor Tchorta Boratto resolveu criar em 2002 o selo independente Mega Music, dedicado exclusivamente a abastecer o mercado brasileiro com diversos ritmos eletrônicos. O irmão e parceiro de Gui Boratto no comando do selo, queria comercializar diretamente ao público brasileiro suas produções, sem enfrentar a burocracia das grandes gravadoras.

Hoje, o selo dos irmãos Boratto já lançou artistas como Kaleidoscopio, o projeto Camará e Leilah Moreno. Tchorta também se dedica a criar remixes: versões de músicas de Mano Chao e de Square, do grupo Killer on the Dancefloor, estão entre suas realizações.

“Gosto de fazer remixes, mas o mais legal é lançar coisas novas, ainda mais porque o meu forte é participar da definição da melodia e da letra”, afirmou Boratto. “Quando produzi o (grupo) Kaleidoscópio, do DJ Ramilson Maia e da (cantora) Janaina Lima, percebi que a música deles era baseada nos ritmos originais da música brasileira. Nesse caso, preferi utilizar elementos orgânicos, como flauta e violão”.

Apesar de ter feito trabalhos do tipo, Tchorta diz que remixar artistas pop do cenário nacional não é uma boa maneira de um produtor apresentar seu trabalho para o grande público. “Pegar uma música que já existe e colocar outra roupagem nela é fácil. Difícil é criar a original”, declara.

Sobre o espaço que o produtor musical tem no Brasil hoje, ele ressalta que a responsabilidade de investir nessa área é das gravadoras. “Se as rádios não tocam, não adianta. As gravadoras precisam investir nesses produtores e artistas de música eletrônica, que é uma tendência mundial”, conta. “Garanto que é bem mais lucrativo do que um monte de lixo que as elas insistem em investir e acabam perdendo dinheiro. O modelo de negócio das majors é arcaico e equivocado”, completa.

O rei das rádios

A não ser que você tenha morado em uma caverna nos últimos tempos, com certeza já ouviu algum remix assinado pelo DJ e produtor Deeplick.

O paulistano, chamado Fernando Leite, é responsável por mais de 110 remixes para artistas de todo tipo. Entre os nomes mais conhecidos para quem já trabalhou, estão Skank, Jorge Vercillo, Jota Quest, Marcelo D2, Cláudia Leitte, Daniela Mercury, Sandy & Júnior, Vanessa da Mata, Seu Jorge e Marisa Monte, além de gringos como Daft Punk, Lily Allen, White Stripes e Beastie Boys. Ele também é compositor: no novo CD de Wanessa, Meu Momento,
do qual é produtor, nove das 11 faixas são assinadas por ele em parceria com a cantora.

Segundo Deeplick, criar um remix é como compor uma música do zero. “Primeiro, defino um caminho para a música. Se por acaso tem algo na música original que combina com a minha ideia, OK. Senão, eu recrio a faixa inteira, do começo ao fim. Mudo velocidade, andamento, tom…”, explica ele. “No caso do remix para a música Ainda Gosto Dela, do Skank, resolvi utilizar o violão do Samuel e o teclado do Henrique. Já nesse último remix que fiz para o Seu Jorge, da música Pessoal Particular, fiz tudo de novo, não usei absolutamente nada do material instrumental. Nos remixes da Vanessa da Mata, por exemplo, usei só a voz dela e fiz a faixa inteirinha de novo”, conta Deeplick.

“O que eu faço não é corrigir nada, e sim criar a minha versão. Então, o remix é a maneira como eu vejo não só a faixa escolhida como o artista. Eu penso: qual ideia tem a ver com o Seu Jorge? Essas três músicas dele que remixei têm um pezinho no samba”, afirma o produtor, que revela que nem sempre o artista gosta da versão final do remix. “Foi o caso da (vocalista do Kid Abelha) Paula Toller. Ela queria que eu fizesse de uma maneira que eu achava que não combinava com o meu conceito da música. Então, a gente teve que chegar num meio termo, porque eu não abro mão da minha concepção artística”, revela Deeplick

Segundo Deeplick, muitas vezes os artistas têm uma ideia errada do trabalho do produtor e solicitam um remix que faça a música estourar nas rádios. “Já aconteceu de me pedirem um trabalho que fique em primeiro lugar nas paradas. Só que se esse sucesso acontecer a partir do que eu gosto e pretendo fazer na música, OK. Caso contrário, está fora de questão. Música não é um produto que você vai no mercado, compra e vai embora”, afirma. “Ninguém tem a fórmula do sucesso”.


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Produtores desconhecidos dominam as rádios e pistas com remixes de artistas pop