Lucas Santtanna grava seu próximo disco


Créditos: Gabriel Quintão

Francês de origem nigeriana, o rapper Féfé surgiu no hip hop com o grupo Saïan Supa Crew. Hoje, seu som é um pop que flerta com o afrobeat, com a música negra dos Estados Unidos, jazz, música de concerto, eletrônica e tudo que vier à cabeça.

Sua liberdade e fluidez de gêneros é mesma que floresce em nomes da MPB alternativa como Anelis Assumpção, Ava RochaCurumin, Céu e Lucas Santanna. Este último, gravou com Féfé durante sua passagem pelo país em maio e propiciou o encontro com o Virgula.

“Sinto as raízes africanas na música brasileira”, afirmou o rapper, em entrevista no estúdio 12 Dólares, no Bom Retiro, em São Paulo. Ele também comentou a crise nigeriana com o grupo extremista islâmico Boko Haram. “Eles não podem parar a música. É algo que está no ar, como que você pode parar algo que não pode pegar? Eu acho que quanto maior a luta, mais forte a música”, defendeu.

Em passagem pela França, no mês passado, em meio a uma turnê europeia, o rapper Emicida também gravou com Féfé, nascido Samuël Adebiyi há 38 anos, em Clichy La Garenne.  

Veja o clipe de Le Charme Des Premiers Jours

Você veio do hip hop, Féfé, qual é a importância dessa origem para você?

Eu comecei em um grupo de hip hop que se chama Saïan Supa Crew, que foi meio que famoso. Durante dez anos viajamos pelo mundo e lançamos três albuns. Há sete ou oito anos, eu saí e comecei carreira solo. Fiz três álbuns e estou escrevendo o quarto.

O que eu faço, o meu estilo, eu não sei o que é. Mas eu tento me divertir com a música e fazer no estilo do hip hop. Eu cheguei ao hip hop porque para mim era como o novo jazz, você pode pegar o rock, o clássico, afrobeat, tudo, e fazer sua própria música. Eu cheguei ao hip hop por essa liberdade.

Quando eu deixei a banda, comecei a aprender a tocar guitarra e cheguei ao meu primeiro álbum, eu estava tentando criar a minha própria coisa.

Quando você conheceu o Lucas?

Ontem (risos).

Eu gostei muito da música dele porque eu gosto de pessoas que têm o seu próprio estilo, que são particulares. Assim que eu ouvi, gostei, achei louco, um pouco fora de tudo.

Porque você acha que as pessoas na França gostam tanto da música brasileira?

Ah, é uma grande questão. Para mim, de alguma forma, é por causa do calor, é algo quente, orgânico. Isso é o que talvez as pessoas sintam em relação à música brasileira. O que eu gosto também é que eu sinto as raízes africanas na música brasileira.

Antes de vir ao Brasil, com o samba, a bossa nova, isso já conversava comigo, mesmo que eu não soubesse nada sobre isso, eu já gostava dos ritmos.

Como você explica que o hip hop, uma música dos Estados Unidos, com raízes na Jamaica, possa alcançar o Brasil, a França, lugares tão distintos e distantes?

É outra grande questão. Para mim é por que essa música veio da luta, sabe? No mundo inteiro existem pessoas que não tem muitas condições econômicas e para fazer rap você só precisa do seu cérebro e da sua boca. Falar o que está no seu coração. Você pode falar com qualquer um ao redor do mundo.

O que você acha de rappers que só falam em gastar dinheiro, de mulheres…

Eu não gosto desse tipo de coisa. Eu gosto do hip hop que fala das coisas reais, dos verdadeiros sentimentos.

Agora o rap dá dinheiro e o que essas pessoas falam é do que elas vivem. Eu acho que é uma pena que você perca a chance de tentar levantar as pessoas pela sua música.

Você vê as estrelas americanas ganhando milhões, talvez essa seja a vida deles, que eles vejam prostitutas o tempo todo, pilhas de dinheiro em todo lugar. Eu não posso culpar pessoas que vieram do nada que elas digam que têm dinheiro. Mas para mim não funciona, não é meu lance, não é meu lugar, eu não consigo.

Como que a música está relacionada com os protestos que ocorreram nas ruas da França há alguns anos?

O rap francês conectado com esses protestos é realmente underground. Mas a maioria não está ligada a isso, estão copiando os americanos mais e mais.

Qual é a principal mensagem da sua música?

Ser livre. É minha mensagem em tudo que eu faço, não tem fronteiras.

E se você tivesse que definir sua missão como músico?

Tem gente que pensa que a música muda o mundo, eu acho que ela acompanha o mundo. Se o mundo muda, a música muda. Não acho que eu tenha uma missão, eu sou bem egoísta com a minha música. Eu preciso fazer música. Se eu tenho uma missão, é tentar ser sincero. Isso é tudo.

O que você espera encontrar aqui no Brasil?

Eu vim especificamente para ir a Salvador. Estou fazendo o meu quarto álbum e eu quero que seja africano de alguma maneira. Não se se pelos ritmos, mas eu preciso ir no caminho dos iorubás. Eu adoraria ir a Cuba também. Eu fui à Nigéria no começo do ano, apenas para captar a essência do iorubá e exprimi-la de alguma maneira. Talvez seja ornânico, eletrônico e africano.

A Nigéria vem enfrentando um grande problema atualmente com o Boko Haram. Você acha que a música local, que tem ícones como Fela Kuti e Tony Allen, sobreviverá à opressão?

Definitivamente. Eles não podem parar a música. É algo que está no ar, como que você pode parar algo que não pode pegar? Eu acho que quanto maior a luta, mais forte a música. É o mesmo para qualquer arte. Quanto mais você tenta oprimir, algo maior surge, pode ser música, pintura. Então eu não acho que o Boko Haram possa parar a música, não mesmo.


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Conheça Féfé, rapper francês que gravou com Emicida e Lucas Santtanna