Julia Branco

Vocalista do recém-interrompido grupo Todos os Caetanos do Mundo, a cantora Julia Branco, que ainda é atriz, estreia, em Soltar os Cavalos (Natura Musical), como compositora em trabalho que conta com participações de Letícia Novaes (Letrux), Paulo Santos (Uakti) e Uyara Torrente (A Banda mais Bonita da Cidade)

Esta semana, ela lançou 30 anos, parceria inédita com Letícia Novaes Composição feita ao lado da artista carioca, que também canta na gravação, a música é uma declaração aos trinta anos de idade. Em vídeo, ela ganhou leitura da diretora Raquel Pinheiro e é o terceiro trecho do vídeo-álbum que antecede o lançamento do disco “Soltar os cavalos”

A gravação, que conta com participação de Letícia Novaes, tem Chico Neves, produtor do álbum, tocando baixo e sino e ainda Luiza Brina nos violões, piano elétrico, piano acústico, baixo-moog, percussões e vocais. Ao fim, Julia lê a carta escrita por ela no dia em que completou trinta anos, e que inspirou a canção.

 

Referência nos vocais da banda Todos os Caetanos do Mundo – que recém anunciou uma pausa -, grupo elogiado por artistas como Arnaldo Antunes, Julia Branco se prepara para fazer uma dupla estreia solo.

Em breve, ela lança o vídeo-álbum Soltar os cavalos, projeto desdobrado em seis canções apresentadas individualmente em trabalhos audiovisuais desenvolvidos por cinco diferentes diretoras.

O projeto fica completo, com um disco de mesmo nome – que sairá em CD e em vinil – que reúne as canções do vídeo-álbum, além de outras cinco composições da artista. É aí que mora a segunda estreia.

A cantora, que há anos desenvolve trabalhos também como atriz, sempre escreveu, mas ainda não tinha transformado sua escrita em canção. No novo álbum, no entanto, ela assina as onze músicas do disco, sozinha ou com parceiras.

Soltar os cavalos traz ainda, entre outros nomes, parcerias com Chico Neves, que dirigiu e produziu o álbum, e que se junta – depois de mais de dez anos distante dos palcos – à banda da artista, um trio composto por ele, Luiza Brina e a própria Julia.

Chico – produtor que já assinou trabalhos ao lado d’O Rappa, Skank, Los Hermanos, Paralamas do Sucesso, entre outros – é um dos grandes entusiastas do trabalho da artista. Foi dele o incentivo para que Julia gravasse suas próprias músicas.

O vídeo-álbum, o álbum – em CD e vinil -, e ainda uma turnê em quatro capitais, conta com patrocínios da Natura, através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais, e do UNI/BH, através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte.

Como apareceu o conceito e o que estava buscando com Soltar os Cavalos?
Julia Branco – Convidei o Chico Neves para produzir e dirigir meu primeiro disco solo e naquele momento eu não tinha muita clareza do que ele seria, tinha apenas o desejo de criar com liberdade. O Chico, como diretor, logo me incentivou a gravar as minhas próprias canções, foi um grande entusiasta das minhas composições e sugeriu que eu montasse o repertório do disco como se ele fosse uma peça de teatro: com começo, meio e fim, com uma curva dramática, com uma preocupação com o discurso, com o que estava sendo dito – tal qual lido no teatro. O caminho, portanto, se daria a partir da palavra, para então virar canção.

Aí convidamos a Luiza Brina para criar a sonoridade do disco junto com o Chico e, de fato, tudo foi feito com muita liberdade, seguindo esse norte. Os sons foram vindo aos poucos, assim como os instrumentos e o universo todo do disco. Em seguida, entendi que a representação desse álbum poderia extrapolar os sons, e formatamos a ideia do video-álbum, que é uma tradução imagética dessas minhas primeiras canções, mas sob perspectiva de diversas mulheres, de outros olhares.

Hoje entendo “Soltar os cavalos” como um projeto sobre ser livre, sobre estar viva e poder agir, sobre o acolhimento da própria vulnerabilidade, sobre o acolhimento de si. No fundo, acho que eu estava buscando encontrar quem é essa nova “Julia”, quem é a “Julia” artista solo e estava buscando me sentir livre também como mulher, como artista, como uma pessoa de 30 e poucos, vivendo em 2018. Continuo nessa busca e vejo que o disco e o vídeo-álbum falam também sobre processo, sobre estar em processo.

Poucas mulheres são produtoras musicais e compositoras, isso é reflexo do machismo?
Julia – Acho que existe uma quantidade enorme de compositoras mulheres. O que acontece, na maioria das vezes, é que as mulheres ainda não têm a mesma visibilidade que os homens, dando a impressão de que existem menos compositoras mulheres do que compositores homens, mas não acho que isso seja verdade. Nos últimos anos, tenho buscado ouvir mais e mais compositoras mulheres e a quantidade é gigante, além da variedade de estilos, de escolhas, de caminhos. Mas sem dúvidas, a projeção a afirmação delas ainda reflete o machismo da cadeia produtiva da musica.

Sobre produtoras musicais mulheres, realmente acho que, de forma geral, conhecemos menos nomes. Por conta do mesmo machismo, se inventiva pouco que as mulheres assumam novos lugares na música. Mas, de um modo geral, se a gente não pesquisar, vamos lembrar apenas de nomes masculinos, dentro do padrão a que fomos acostumados a perceber a música, com a mulher no lugar de musa, e o homem assumindo os processos criativos.

O que está rolando de mais interessante na música hoje, na sua opinião?
Julia – Creio que o mais interessante, hoje, é a busca de se ter cada vez mais autonomia criativa, permitindo mais diversidade de resultados. Hoje é possível ver mais mulheres ocupando novos espaços, mais negros ganhando projeção, mais trans conquistando destaque na música, seja no mainstream, seja no que se costuma chamar e mercado independente. Também vejo que existe uma força grande na palavra, no discurso. Talvez até porque estejamos vivendo um momento difícil no mundo, uma certa crise da comunicação, existe mais potência no pensamente, na fala, na ideia, e isso se traduz em trabalhos muito fortes, que buscam transformar, trazer potência, trazer vida.

O que te leva a fazer uma música nova?
Julia – As minhas músicas nascem nos momentos mais inesperados. Tenho muitas ideias no trânsito, quando estou dirigindo, tomando banho, na fila de um atendimento, enfim, é engraçado, porque parece que é numa situação bem ordinária, bem cotidiana, que uma ideia brota em mim. Aí é hilário, sou cheia de áudios no meu gravador, de pedaços de palavras anotadas em caderninhos, minhas “notas” do celular são uma loucura.

Muitas vezes o que me leva a fazer uma música é uma frase que eu penso, alguma coisa que eu escutei de alguém, um sentimento de angústia, uma alegria enorme, uma imagem. Normalmente as minhas músicas partem da palavra, mas já aconteceu também de eu cantarolar uma melodia e, a partir daí, botar letra, de receber uma “encomenda” de algum parceiro etc.

Ultimamente tenho feito o exercício de todos os dias escrever alguma coisa, ainda que seja algo muito bobo. É como num diário, minhas canções são um diário banal se revelando, e por isso, acho, ganhando eco, porque o que há em nós há também no outro, e a canção é o ponto de encontro entre o que guardo aqui e o espaço que há no outro para acolher aquilo, para se identificar.

Pra mim, criar é trabalho, é se manter em estado de observação. Por isso, acho que o que me leva a fazer uma música nova é esse estado de alerta, de que qualquer situação pode trazer algo interessante. Quando estou com essa percepção mais aguçada, sinto que produzo mais.

Que característica crê que seja a mais marcante da sua geração?
Julia – Acho que a diversidade é o grande ponto de virada da minha geração. Ainda que não tenhamos igualdade nos espaços, existe hoje uma produção muito potente justamente por conta da diversidade de vozes. Seja porque escutamos mais o país hoje para além do eixo sudeste, seja porque as chamadas minorias vem ganhando maior notoriedade. Por mais que a gente ainda não possa falar em igualdade, acho que a minha geração tem buscado a diversidade e deseja que todos possam ocupar novos espaços. É muito especial poder ver tanta gente incrível produzindo, poder me inspirar nos meus contemporâneos, poder escutá-los e aprender com eles.

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Créditos: Caroline Lima

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'Diversidade é ponto de virada da minha geração', diz Julia Branco