Luiz Garrido/Divulgação Céu

Quando Herbie Hancock comparou Céu a Miles Davis, ele provavelmente estava falando de melodia e harmonia, mas talvez estivesse se referindo também a um traço de personalidade. Céu, como o mago negro, tem uma aura meio misteriosa. Ela é na dela, não faz o jogo de celebridade, mas é ela que dá as cartas. Se existe uma MPB indie, muito se deve a Maria do Céu Whitaker Poças.

“Eu aprendi muito mais a lidar com o palco. Eu era muito mais tímida, não tinha essa estrada. Acho que tocar, fazer turnê, enfrentar diferentes plateias que falam línguas outras, não entendem o que eu estou falando, tudo isso foi muito importante. Na estrada, meu sistema é bem rock mesmo, não tem glamour nenhum. É como se fosse uma banda de rock, a gente vai, um show depois do outro. E isso me fez ficar mais confiante, mais segura e cada vez mais eu no palco”, afirma Céu ao Virgula Música, em entrevista exclusiva.

Em Tropix (Slap), quarto álbum, Céu promove mais uma mutação no DNA da música nômade planetária, fruto da produção de Pupillo, da Nação Zumbi, e do francês Hervé Salters, da General Eletriks.

Leia a conversa com a paulistana de 36 anos que faz show de lançamento do novo disco em São Paulo nos dias 28, 29 e 30, no Sesc Pompeia.

Fazer um disco diferente do outro, é um processo natural por querer não se repetir, ou é um processo das suas mudanças?
Céu – Olha, eu concordo em parte com você, eu não acho tão diferente um do outro, eu acho que tem uma roupagem diferente das coisas, mas se você tira os arranjos e fica só as canções que é o que de fato faz o meu trabalho ser o meu trabalho, eu acho que existe uma unidade.

Eu concordo com você que eu, sim, eu gosto de dar aquela puxadinha de tapete pra mudar, o Caravana era um disco que falava muito de um Brasil específico, que passava por uma linguagem meio circense, meio de estrada, meio cinema nacional, tal, esse é um disco que é uma ode às máquinas, é uma coisa mais estética, mas, assim é superbrasileiro, é uma máquina que não é exatamente a máquina alemã. É uma máquina sintética, mas que no trópico. Uma máquina no trópico enferruja (risos), não é a mesma.

A minha tropicalidade do samba, do maxixe, do xaxado, do que quiser que seja, sempre está, sempre tem essa marca nos discos, mas eu acho legal pode fazer, sim, novos arranjos, e surpreender as pessoas que curtem meu trabalho com uma nova roupagem, vamos dizer assim.

Nos shows aqui no Brasil, você vai ter outra banda, João Leão no teclados?
Céu – É, tem o João no teclado, Luquinhas, o Lucas Martins que toca comigo desde sempre, no baixo, o Pupilo, que produziu o disco, e o Davi Bovee na guitarra.

Como que você conheceu o Hervé Salters, do General Eletriks?
Céu – Foi o Lucas,  ele também toca com o Curumin e os dois fizeram uma turnê acho que nos Estados Unidos. A gente sempre se trombava na estrada. Eu via o Hervé, ia aos shows da General Eletriks e o achava muito talentoso, me identificava com o jeito dele como músico, produtor. O jeito dele de pensar parecido com o meu.

E quando eu decidi fazer o disco com o Pupilo a gente achou que seria legal trabalhar com uma pessoa que tivesse um olhar mais distante do Brasil, sabe? Não tão imerso como a gente mesmo é. Então a gente chamou uma terceira figura que se encaixou superbem com a tropicalidade natural que o próprio Pupilo traz nas baterias, nos beats e tal, ele veio com uma coisa sintética europeia. E essa liga é superbonita entre eles dois.

Você curte sons eletrônicos?
Céu –  Curto. Quando eu estava fazendo o Tropix, eu estava ouvindo bastante sons mais eletrônicos. Estava ouvindo coisas de pós-punk, de glam rock, mas sempre ouvindo as coisas de sempre, Jorge Ben, afrosambas, isso ainda tem no meu trabalho, mas a roupagem ficou mais sintética, mais dura, vamos dizer assim.

Céu

Céu
Créditos: Luiz Garrido

E como que na Europa onde você esteve recentemente, perceberam que havia essa coisa fria no meio do quente?
Céu – Sim, completamente. Inclusive é engraçado, você começou falando, “é diferente e tal”, mas na Europa, eu vi o Guardian, por exemplo, é “Céu volta às suas próprias origens”. É justamente isso, eles entendem que o que eu estou fazendo não é tão diferente do que eu sempre fiz. É só uma outra leitura, uma outra maneira de mostrar o trabalho. O quente, o frio, mas muito ainda do que foi feito. O primeiro disco já flertava com eletrônico, com beat, tinha base, uma coisa meio do rap.

Esse também tem, eu queria voltar a usar beat, que eu usei no primeiro show, no primeiro disco. Mas com isso, com essa brincadeira de ser o quente/frio como você mesmo disse e transitar nesse universo frio, mas sendo quente.

Quanto tempo de carreira você tem, Céu?
Céu – O primeiro foi de 2005, né? Estou fazendo 11 anos.

Que mudança você percebeu na cena em geral e da música brasileira estar mais forte?
Céu –Eu acho que mudou muita coisa. Eu peguei a rebarba de uma época em que a música ainda tinha aquela coisa de gravadora. Hoje mudou completamente, a internet veio devastadora e mudou todo o sistema de venda, de escuta de música. Hoje, pode-se dizer que a música virou um serviço. Como se fosse uma conta de água, de luz, você tem a conta de música. Você tem ali o streaming. E o vinil mostrou que realmente veio para ficar, uma coisa superanalógica, no mundo superdigital.

Eu aprendi muito mais a lidar com o palco. Eu era muito mais tímida, não tinha essa estrada. Acho que tocar., fazer turnê, enfrentar diferentes plateias que falam línguas outras, não entendem o que eu estou falando, tudo isso foi muito importante.

Na estrada, meu sistema é bem rock mesmo, não tem glamour nenhum. É como se fosse uma banda de rock, a gente vai, um show depois do outro. E isso me fez ficar mais confiante, mais segura e cada vez mais eu no palco.

Isso se reflete até na capa do disco, você tá de frente…
Céu – O Tropix eu acho que é um disco que eu me sinto mais madura nesse aspecto. Até pra olhar de frente, fazer uma capa preto e branco. Preto e branco é uma coisa supersucinta, preto no branco e fora esse conceito do Pixel, da leitura digital, só que meio zoada, que até o clipe trouxe do glitch e tal, eu também estava querendo composições bem sucinta, bem simples, onde você pega os arranjos, pega o violão e toca, sabe?

Você compõe no violão?
Céu – Não, eu componho mais no piano, eu não toco violão. Eu até gosto de ter um violão, brinco, mas eu não sei tocar violão, eu toco piano.

É mais completo, né?
Céu – Eu pra mim é mais fácil, eu aprendi no piano e o violão eu achava bem diferente, esquisito para por os acordes, eu acabei ficando no piano mesmo.

Quem for ao show, o que pode esperar? Como você gostaria que as pessoas saíssem do seu show ou mesmo após ouvisse o disco?
Céu – Olha, eu acho que o Tropix se rendeu mais ainda à dança, mais ainda que meus outros shows. Então, eu convido as pessoas a escutarem e dançarem. Eu adoro quando o show é sem cadeiras, é gostoso pra mim também, a turma se solta.

SERVIÇO

Céu – Lançamento de disco novo Tropix, no Sesc Pompeia
28/04. Quinta, às 21h30
29/04. Sexta, às 21h30
30/04. Sábado, às 21h30
Comedoria, PROJETO PLATAFORMA+
O repertório é basicamente formado por músicas inéditas e autorais.
Não recomendado para menores de 18.
De R$ 9 a R$ 30.
SESC Pompeia – Rua Clélia, 93. Não tem estacionamento.
Para informações sobre outras programações, acesse o portal sescsp.org.br/pompeia


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'Na estrada, meu sistema é bem rock, não tem glamour', diz Céu

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