Dia do Disco


Créditos: gabriel quintão

“Se não fosse o vinil, a loja teria fechado”. A frase de Anderson Ricardo Martins, supervisor de vendas online da Baratos Afins, é uma constatação do que se tornou o mercado de discos. Neste sábado (20), é Dia do Disco, e aqueles que escolheram esta cultura como negócio, voltaram a ter motivos para comemorar. 

Martins conta que na Galeria do Rock, onde a Baratos está desde 1978, houve uma época no fim dos anos 90 que as lojas de CDs dominaram a galeria. Com a pirataria e a música digital, sobreviveram apenas quem já estava lá, anterior ao boom. E olhe lá, alguns dinossauros também não aguentaram.

“A melhor época foi 94-96. As pessoas traziam a coleção de vinis e trocavam por três, quatros CDs. Foi quando a gente conseguiu coisa boa”, lembra o funcionário de 35 anos, desde os 13 na loja. Ele diz que hoje o vinil representa entre 75% e 80% do lucro da Baratos.

“Cada disco tem uma história e cada história tem o seu valor”, afirma Martins, ressaltando que nem sempre este valor implica em valorização. “Às vezes, o cara chega com um disco autografado e acha que vale muito. Mas se está autografado para Roberto e eu não me chama Roberto, aquilo não tem valor para mim”, avalia.  

No Brasil, há discos que podem alcançar R$ 7 mil. No acervo de 100 mil discos da loja, o mais valioso é Paêbirú: Caminho da Montanha do Sol, de Zé Ramalho e Lula Côrtes, lançado em 1975. Psicolélico e minimalista é um disco “chato”, segundo Martins. Das únicas 1,3 mil cópias da prensagem original, mil foram perdidas numa enchente em Recife e por este motivo o disco é raro. Sai por R$ 3,5 mil. Louco por Você, o primeiro LP de Roberto Carlos, um álbum de bossa, é outra pepita garimpada em sebos do mundo.

Patrulha do Espaço, o Brazilian Octopus, de Hermeto Pascoal, Lanny Gordin, Olmir “Alemão” Stocker, entre outros e a trilha de O Rebu, de Raul Seixas, estão entre outros dos mais caros da Baratos.   

E por falar em Raul, enquanto o Virgula Música estava na loja, Edy Star, único remanescente da Grã Ordem Kavernista, banda de Raul, apareceu por lá. Ele contou que a primeira coisa que faz quando acorda é colocar um disco na vitrola.”Eu para acordar, tenho que ouvir música. Se eu estou sozinho em casa, dá impressão que tem gente em casa”. 

Star disse à reportagem que a banda de Raul jamais poderia imaginar que um dia Sessão das Dez poderia ser vendido a peso de ouro. “Jamais pensei que esse disco poderia voltar porque ele entrou no ostracismo 15 dias depois de lançar”, diz ele, dizendo que gravadora CBS o recolheu, com medo da ditadura, dando pista de porque ele é raro. “Queríamos apenas gravar um disco. Na época se pretendeu, como o disco é muito variado, tinha a ideia de fazer depois uma ópera rock. Chegamos a comprar umas roupas em brechó, eu tinha um casaco de general muito bonito , vermelho”, lembra que ele, que é pioneiro do glam rock no Brasil.

Sobre o motivo que faz com que Raul seja idolatrado, Star arriscou uma análise: “Eu acho que a identicação maior é das pessoas pensarem que o Raul era um cara louquíssimo. A imagem que ele passa é que era um cara louco, drogado o dia todo, como eles chamam, atitude rock and roll. Quando Raul era caretíssimo, depois passou a usar droga quando conheceu o Paulo Coelho. E depois perdeu as rédeas do personagem”, avalia. “No final de vida ele já não tinha os dentes, se mijava, tem uma série de coisas”, lamenta.

“Eu era mais despirocado que todos eles (Além de Raul e Star a banda era formada por Sérgio Sampaio e Miriam Batucada). Porque tinha um outro tipo de vida. Eu vivia na noite, nenhum deles vivia na noite. De cabaré, de boates, frequentava a Lapa, era amigo de marginais, de bandidos”, afirma Edy, um ícone gay da música brasileira.

“Raul criou esta imagem de loucão e as pessoas acham isso uma maravilha. Como não podem ser, se projetam na figura de Raul. E além do mais as músicas de Raul falam são tudo aquilo que a juventude, o pessoal de hoje, gostaria de cantar. Então como não tem gente fazendo este tipo de música, tocam as músicas de Raul. É o ‘toca Raul’, que eu acho muito bom, não sou contra não. Afinal de contas, ainda vivo fazendo shows em tributo a Raul”, afirma.

Star, como a reportagem, tinha ido à loja em busca de Luiz Calanca, o dono da Baratos, a quem considera uma “enciclopédia”. Ele havia saído para almoçar, às 16h e, segundo seus funcionários, costuma demorar até 1h30 no rolê. Mas é como uma loja de disco, nem sempre você sai com o que estava procurando. E esse é o grande barato.


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No Dia do Disco, lojista conta que vinil salvou o mercado