“Através destes olhos nós chocamos o mundo / sem medo algum, com cabeça forte / opressão e hostilidade / mas existe uma diferença: nós estamos livres”. Os versos da faixa Spectrum dão uma boa idéia do que é o novo Sepultura. O título do 12° álbum da banda, Kairos, significa na mitologia grega um momento de oportunidade e mudança, revelando uma relação crucial com a situação atual do grupo. “Nós respeitamos o nosso passado, mas não estamos presos nele”, explica o guitarrista Andreas Kisser. “Vivemos o momento com muita intensidade e é isso que o Kairos representa: o que é o Sepultura hoje.”

O disco reflete em suas letras tudo o que o Sepultura tem passado nos últimos anos: turnês, conflitos, separações, apoio e reações adversas de fãs e críticos. “Este é um trabalho que é inspirado nos 26 anos de carreira e mudanças dentro e fora da banda. Temos músicas para as nossas famílias, falamos da relação com a imprensa, empresários, gravadoras, fãs e amigos. É um disco muito pessoal e íntimo”, conta Kisser, que assina as letras do álbum em conjunto com o vocalista Derrick Green, que assumiu o posto após a saída nada amigável de Max Cavalera, em 1996. Seu irmão Iggor saiu dez anos depois, deixando a bateria a cargo de Jean Dolabella. Completa a banda o baixista Paulo Jr. – único integrante presente desde fundação do Sepultura.

Ainda tentando dissipar a sombra da formação que conquistou reconhecimento mundial com álbuns como Chaos A.D. e Roots, o Sepultura revela Kairos como um marco de provação. Apresentando um som mais direto e pesado como no início thrash da banda, o registro exclui os experimentalismos e orquestrações dos trabalhos conceituais anteriores, Dante XXI (baseado no livro A Divina Comédia, de Dante Alighieri), de 2006, e A-Lex, de 2009, que buscou inspiração no livro Laranja Mecânica, de Anthony Burgess. O único toque de experimentalismo do novo álbum ficou na última faixa, Structure Violence (Azzes), que conta com a parceria do grupo percussivo francês Les Tambours du Bronx.



Kairos foi produzido por Roy Z, que já trabalhou com gigantes do metal como Judas Priest, Rob Halford, Bruce Dickinson e Helloween. “Conhecemos o Roy de longa data. Ele é um excelente músico e produtor e foi esta mistura que fez com que ele fosse o escolhido para este trabalho”, afirma Kisser. “Ele não é um produtor que fica somente dentro do estúdio, é também um músico muito ativo. Ele foi a escolha perfeita, tem grande know-how técnico e sensibilidade musical.”

O novo disco também difere em seu processo de criação: as sessões de gravação foram transmitidas ao vivo pela internet. “Foi muito interessante, foi a primeira vez que fizemos isto e eu achei que foi muito positivo. Trouxemos os fãs para dentro do estúdio e percebemos que muita gente não tem a mínima noção do que é preciso para se fazer um disco; o tempo que leva, os detalhes e tudo mais. Foi um processo educativo pra muita gente”, opina o guitarrista, que admite que se sentiu um pouco desconfortável com o assédio das câmeras no começo das transmissões. “Foi um pouco estranho, mas depois nos acostumamos e pudemos curtir a situação. É provável que na próxima façamos de novo”, prevê. O making of do álbum será lançado em breve em DVD, com o material difundido na internet e extras.

Nova gravadora

O sangue novo do Sepultura também deve-se à nova gravadora Nuclear Blast Records, considerada um das principais selos independentes do rock pesado. “A Nuclear Blast entende o heavy metal. O pessoal que trabalha lá é, antes de tudo, fã do estilo. Eles conhecem o mercado das bandas e sobrevivem até hoje, apesar da internet e downloads. Estão na ativa porque sabem o que fazem. Eu não trocaria uma gravadora assim por nenhuma major label”, garante o guitarrista.

Talvez por conta do vazamento prematuro do álbum na internet, o grupo adiantou o lançamento do disco em uma semana – inicialmente previsto para agosto, Kairos foi antecipado para o dia 24 de junho. Apesar disso, a opinião da banda sobre compartilhamento de músicas na internet não é ‘quadrada’. “Acho que a tecnologia está aí para ficar, não tem volta. Ainda estamos em um processo de transição, tudo aconteceu muito rápido. O monopólio das gravadoras não é mais o mesmo, tem mais oportunidade para artistas independentes mostrarem o seu trabalho. Acho mais democrático”, opina Kisser.

Em abril deste ano, a banda tocou na Virada Cultural, em São Paulo, em um show único com a Orquestra Experimental de Repertório (corpo artístico do Teatro Municipal de São Paulo), na Estação da Luz. Para os fãs que querem conferir Kairos ao vivo, Andreas dá uma prévia da agenda do Sepultura. “Temos o Rock in Rio no dia 25 de setembro e logo depois teremos umas datas com o Machine Head pelo Brasil e América do Sul.”




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Semana do Rock: "Respeitamos nosso passado, mas não estamos presos nele", diz Sepultura