O rock brasileiro deve muito à cultura do remix e aos DJs. Em 1984, uma versão de Loiras Geladas, do RPM, feita pelo trio DJ Grego, Julinho Mazzei e Iraí Campos abriu espaço para a música e, junto, de toda a nova cena, nos rádios e nas pistas. Sem os remixes, hits de Kiko Zambiachi, Kid Abelha, Barão Vermelho e Paralamas do Sucesso talvez tivessem permanecido no limbo.

Hoje, quase três décadas depois, o lado mais pop da eletrônica, o synth pop, passa por um revival com a emergência de bandas e projetos no Brasil. Um renascimento iniciado no começo do milênio com Tetine e No Porn desembocou em nomes surgidos mais recentemente como Oui Madame, The Drone Lovers, Mixtape, Copacabana Club e a dupla de produtores e DJs Daniel Cozta e L_cio, do Lacozta que apostam em Simpaticona da Boate, faixa com vocal da DJ e jornalista Claudia Assef, que ecoa a Tiga e aos oitentismos.

O Virgula Música entrevistou Catarina Bris, que forma o Oui Madame com Sandra Gamon, também integrante do Samba de Rainha. “Nós somos da geração pós-tudo. A criação da linguagem MIDI fez com que todos os timbres conversem em uma mesma plataforma. Não temos mais a barreira física entre adquirir os sintetizadores e trabalhar limitados a uma quantidade de possibilidades de timbres que ele oferece, como aconteceu nos anos 80 ou 90, por exemplo, que a cada lançamento de um novo instrumento e timbres as músicas acabavam refletindo também esta evolução tecnológica, marcando muito a sonoridade de uma determinada época”, afirma respondendo a pergunta sobre qual é a diferença entre o momento atual e os anos 80.

Cápsula do amor, Oui Madame

“Claro que hoje as inovações são muitas, sobretudo nesta área, temos uma quantidade enorme de referências musicais e de timbres disponíveis, inclusive de qualquer período. Fica mais difícil definir um único instrumento como protagonista. É uma questão de norte no seu próprio trabalho, e de saber exatamente o que se quer para o som em cada disco. Ter personalidade própria no trabalho, este é o diferencial buscado pelo produtor musical de hoje ou de qualquer outro tempo”, completa. 

Sobre as preferências musicais da dupla, ela cita artistas de diferentes épocas e gêneros. “Do som mais atual gostamos de ouvir sons de estilos diferentes, Franz Ferdinand, The Black Keys, Wild Belle, Gossip, Cut Copy, Darwin Deez, The Amplifettes, Hot Chip, Miike Snow, Brigitte, Feist, e Norah Jones, que amamos. Mas, ouvimos muito Blondie, Rolling Stones, Beatles e uma boa Madonna. Rita Lee, Marina, Marisa Monte e muito Caetano Veloso não faltam na seleção musical”, afirma.

Catarina concorda que há uma ligação umbilical entre synth pop e o punk. “Talvez a energia seja parecida, pois com a popularização dos softwares de produção musical, a produção passou a não ser mais restrita a algumas empresas e ou gravadoras grandes, sendo agora acessível a muito mais pessoas. Hoje se você realmente quer fazer música, conta com caminhos mais abertos, mas, não menos difíceis, as dificuldades são apenas diferentes. Tem que trabalhar muito. O próprio cenário atual onde novas bandas, cantores e compositores se lançam de maneira independente no mercado, nos lembra do ‘faça você mesmo’ vivido no surgimento do movimento punk. Neste aspecto o espírito punk ainda vive”, avalia.

Para ela, a re-emergência do synthpop pode estar relacionado com o zeitgeist (o espírito do tempo). “O computador doméstico mudou tudo, até mesmo a relação das pessoas com o eletrônico. Hoje a tecnologia digital permeia muitos aspectos da vida de muitas pessoas, talvez a própria assimilação destas sonoridades hoje seja diferente. O sintetizador não é mais uma novidade, mas as músicas novas, sim. Hoje usamos o sintetizador como um instrumento que existe e é rico em timbres, sonoridades e possibilidades. Ele é usado em praticamente todos os estilos musicais”, ressalta.

Entusiastas de mulheres como Billie Holiday, Nina Simone, Édith Piaf, Janis Joplin, Donna Summer, Madonna (“Estas influenciaram e influenciam muita gente até hoje”), as integrantes da Oui Madame também jogam em seu caldo a questão de gênero. “Poderemos deixar de ser feministas quando a igualdade entre homens e mulheres for um fato e não um objetivo. Este tema está presente em nosso trabalho, assim como outros temas atuais. Em nossas letras sempre tentamos transmitir uma leveza sem deixar de tratar de temas importantes. Consideramos este tema importante e abordamos naturalmente esta questão em nossas composições”, diz Catarina.


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Synthpop brasileiro ressurge com novas bandas e projetos; conheça Oui Madame